quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Descarbonização

O cimento se relaciona a pelo menos 30% das emissões de gases efeito estufa que poderiam ser eliminadas com tecnologias estabelecidas, no entanto, tornar o setor completamente ecológico, segundo especialistas,  exige medidas tanto do lado da oferta como da procura na equação. Em mergulho no tema, a Canary Media esclarece que a química, preocupações com a fiabilidade das alternativas, custos proibitivos e falta de procura dificultam a descarbonização do cimento, “um dos blocos de construção do mundo moderno”,  não havendo dúvida que a indústria do cimento precisa ser descarbonizada e, se fosse um país, o setor ocuparia o 3º lugar no mundo em termos de emissões, depois da China e EUA, significando que a descarbonização total “exigirá ação grande e ambiciosa”. Líder na produção do cimento, o Holcim Group, “reduziu  suas emissões nos últimos anos”, segundo Canary Media, com o relatório anual de 2022 alegando redução de 21% nas emissões de carbono comparada com 2021, em grande parte graças às mudanças materiais que reduziram o uso de “clínquer”,  insumo de cimento intensivo em carbono e responsável pela resistência e durabilidade do concreto, sendo que o processo de criação do clínquer envolve cozinhar o calcári a temperaturas próximas dos 1.500°C produzindo CO2 como resíduo. Na redução do clínquer e busca por matriz alternativa, “a matemática é simples na substituição do clínquer”, segundo o Canary Media, “quanto maior a quantidade de clínquer substituída por outro material, menor a pegada de carbono por tonelada de cimento resultante”, já, o cimento calcário Portland, utiliza calcário triturado em vez de superaquecido, atualmente substituto mais popular, seguido pelas cinzas das usinas de carvão e escória das siderúrgicas, no entanto, ambos contributos são limitados no tempo e, segundo o consultor político do DOE, Gabinete de Programas de Empréstimos do Departamento de Energia dos Estados Unidos, em futuro livre de combustíveis fósseis, “não estarão disponíveis em quantidades necessárias”.

Outro fator que contribui à pegada de emissões do cimento é o calor extremo que exige o processo industrial, tradicionalmente dependente  de combustíveis fósseis e, desde 1995, a indústria americana reduziu em 10% suas emissões por tonelada de cimento produzida  através da queima de gás em vez de carvão ou coque e, ao substituir o gás por combustíveis residuais, como pneus velhos, reduziria as emissões em mais 5 a 10% até 2030, afirmação da Canary Media, mas o potencial é limitado e a implantação acarreta restrições de abastecimento e ambiente, sendo que outras possibilidades como a eletrificação e hidrogênio limpo, são “proibitivamente caras” ou “tecnologicamente nascentes”. A Canary Media afirma que projetos de investigação e start-ups trabalham em substitutos de próxima geração ao clínquer e, alguns deles já atingiram a fase piloto, mas a revisão da indústria começaria com a prova de conceito em uma única fábrica integrada de produção de cimento e, isso, ainda não aconteceu se devendo em parte a deniminada  “complexidade incrível” da química do cimento e aplicações no mundo real em meio a “debates entre cientistas” esclarecendo sobre se uma reação química específica ou outra produzirá formas melhores ou piores de concreto, dependendo da aplicação. Capturar e armazenar CO2 gerado na combustão do calcário é o “objetivo de médio prazo” para reduzir emissões do processo, mas o elevado custo de capital do equipamento necessário e custo energético ao funcionamento ascendem a US$ 25 a US$ 55 por tonelada de cimento produzida, significando que “a mudança na escala necessária à indústria do cimento não será barata nem rápida”. O setor americano “necessita investir US$ 20 bilhões acumulados até 2030 e entre US$ 60 bilhões e US$ 120 bilhões até meados do século”,  “ muito para indústria que faturou menos de US$ 15 bilhões em vendas em 2022" considerando que empresas de cimento competem com margens mínimas.” A redução do carbono no setor depende de “sinais de procura”, ou, “mandatos e incentivos dos compradores de cimento que recompensem investimentos e riscos” assumidos ao passo que governos poderiam desempenhar papel uma vez que “metade da procura de cimento nos EUA é impulsionada por compras federais e estaduais.”

Moral da Nota: os 20 maiores países produtores de combustíveis fósseis do mundo deverão extrair petróleo, gás e carvão mais que suficiente em 2030 para derrubar esperança de manter o aquecimento global em 1,5°C e, o Canadá,  prevê o 4º maior aumento na produção de petróleo, se a tendência continuar, o orçamento de carbono restante que dá a probabilidade de 50% de atingir a meta de 1,5°C será esgotado até 2030. O Relatório sobre a Lacuna de Produção de 2023 produzido pelo Instituto Ambiental de Estocolmo, SEI, Climate Analytics, E3G, Instituto Internacional ao Desenvolvimento Sustentável, em Winnipeg, e Programa da ONU ao Meio Ambiente, esclarece que “apesar de sinais encorajadores de uma transição emergente à energia limpa, os governos planejam produzir mais que o dobro da quantidade de combustíveis fósseis em 2030 inconsistente com limitação do aquecimento a 1,5°C.” O relatório mostra que a combinação de políticas proporcionando aumentos na produção de petróleo e gás até 2050, com modelos mais recentes apontando à reduções, mas não eliminação progressiva até 2050, sendo que os países apesar das promessas de redução de emissões emitidas em setembro de 2022,  "planejam aumentos a curto prazo na produção de carvão e a longo prazo de petróleo e gás” e “no total,  planos e projeções governamentais levariam a aumento na produção global até 2030 ao carvão e até 2050 ao petróleo e gás, criando lacunas de produção maiores ao longo do tempo.” Dos 20 países descritos no relatório, 17 adotaram compromissos de emissões líquidas zero ou decidiram reduzir as emissões provenientes da produção de combustíveis fósseis, no entanto, compromissos até à data são “insuficientes”, segundo o relatório, por exemplo, embora 14 dos 20 tenham adotado Compromisso Global ao Metano que exige redução de 30% até 2030, necessitaria declínio de 60% para alinhar-se a meta climática de 1,5°C, sendo que a maioria dos países “continua promover, subsidiar, apoiar e planear expansão da produção de combustíveis fósseis e nenhum se comprometeu reduzir produção de carvão, petróleo e gás em linha com a limitação do aquecimento a 1,5°C.” Ao combinar eliminação progressiva dos combustíveis fósseis e metas de redução de emissões com políticas que garantam transição justa e prática às forças de trabalho e comunidades afetadas, os países podem “reduzir custos da descarbonização, promover coerência política e garantir energias renováveis, em vez de aumentarem,  energias fósseis”. Apontam “grandes incertezas” nas CDR, tecnologias de remoção de CO2, e de captura e armazenamento de carbono, CCS, que figuram de forma proeminente na modelagem climática em que se baseou o Relatório sobre Lacuna de Produção, enquanto  “80% dos projetos-piloto de CCS nos últimos 30 anos falharam” e há “preocupações generalizadas nos potenciais impactos negativos decorrente o uso extensivo da terra para CDR convencional, ou, novo, que afetaria biodiversidade, segurança alimentar e direitos dos povos indígenas e usuários tradicionais da terra.” O relatório conclui que “o potencial fracasso das medidas se tornarem suficientemente viáveis em escala, os danos não climáticos a curto prazo dos combustíveis fósseis e outras linhas de evidência, exigem eliminação global mais rápida dos combustíveis fósseis".