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sexta-feira, 7 de abril de 2023

Opioides

O Centro Taub de Estudos de Política Social de Jerusalém sugere ações imediatas a serem tomadas para reduzir o consumo e uso de opioides, além do clinicamente necessário, considerando que Israel ultrapassou em 2020 os EUA no consumo de opioides para aliviar a dor, incluindo fentanil, 50 vezes mais forte que a heroína.  O relatório apresenta fatos do consumo de opioides e seus efeitos com pesquisadores incluindo alternativas mais seguras no controle da dor, melhor acessibilidade ao tratamento médico, saúde mental, serviços sociais e redução do estigma relacionado a uso e abuso de drogas. No entanto, estudos internacionais mostram que o consumo de opioides por pacientes ambulatoriais é observado nos mais jovens que não apresentam condições ou doenças graves e, descobriram que, desde 2014, a maior parte do aumento no consumo opioide ocorreu entre pacientes com baixo nível sócio econômico indicando que israelenses jovens, saudáveis e pobres estão entre os que contribuem ao aumento do consumo de opioides. Os autores enfatizam que em 2012 nos EUA, 80 mil pessoas morreram por overdose opioide e que Israel não atingiu esse nível e, devido restrições religiosas, tem uma das taxas mais baixas de autópsia  entre os países desenvolvidos dificultando detectar mortes por opioides ou sinais de epidemia. Efeitos negativos no abuso opioide como, sonolência, confusão, náusea, constipação e depressão respiratória com risco de vida, são sintomas de abuso prolongado fazendo com que o corpo desenvolva altos níveis de tolerância e necessidade de aumento da dosagem além do nível de prescrição original. O sistema de saúde e o ambiente social de apoio são necessidades no abuso e busca de drogas ilícitas, além do aumento na  probabilidade de overdose e morte, com abstinência não supervisionada  expondo a sintomas difíceis. O Centro Taub para Estudos de Política Social em Israel é instituto de pesquisa socioeconômico independente e apartidário que fornece à tomadores de decisão e público, pesquisas e descobertas sobre questões críticas nas áreas de educação, saúde, bem-estar, mercado de trabalho e política econômica para promover o bem-estar israelense.

Israel até 2011 tinha taxa baixa de consumo opioide prescrito e baixo uso de  morfina, oxicodona e fentanil que dependia de alternativas e opioides mais fracos, como propoxifeno e codeína. Proibiu o uso de propoxifeno devido efeitos colaterais cardiológicos em altas doses e, em 2014, impôs limites ao uso de codeína levando ao aumento no uso dos opioides fortes como oxicodona e fentanil e, desde 2014, houve aumento acentuado no uso deste último. Pesquisadores recomendam a autoridades de saúde estudarem outros países que sofreram crises de opioides, como EUA e Canadá, e adotem práticas que desenvolveram e implementaram com sucesso. Recomendam protocolos seguros para prescrições, redução do número de prescrições desnecessárias de fentanil, ampliação do tratamento e fiscalização de abuso, cooperação e maior acessibilidade à assistência social. A etapa política adicional seria incluir o fentanil na triagem regular de drogas, nos EUA por exemplo,  quando o teste de fentanil foi adicionado aos testes de triagem, descobriu-se que respondia pela maioria das overdoses de drogas, em 2019, 80% dos testes de triagem para fentanil no estado de Maryland foram considerados positivos. A Associação Médica de Israel em 2016 divulgou recomendações para evitar prescrições injustificadas de opioides e tratar o vício, soluções, não implementadas e nem integradas à prática clínica. Setores vulneráveis seriam protegidos contra o vício e danos causados pelo uso indevido de opioides com vigilância das prescrições quanto dos resultados adversos, como transtorno do uso e overdoses, sendo a vigilância realizada através do uso de dados disponíveis ao público, quase em tempo real, relacionados a medicamentos prescritos. A disponibilidade de registros eletrônicos de saúde coloca Israel em vantagem aos EUA no monitoramento de prescrições e históricos médicos de pacientes, usados para informar decisões aos mais vulneráveis. A Instituição de prescrições seguras incluindo uso de substitutos do fentanil e alternativas de fármacos  à base de opiáceos entre pacientes de alto risco, usando sistemas de monitoramento de medicamentos prescritos para informar médicos e administradores em hospitais, clínicas e farmácias de fundos de saúde, bem como educadores.

Moral da Nota:  a Teva Pharmaceutical Industries pagará US$ 523 milhões ao estado de Nova York, parte de acordo nacional de ações judiciais sob a acusação que a empresa ajudou alimentar a epidemia de opioides nos EUA. O acordo acrescenta US$ 300 milhões aos pagamentos de opioides da Teva, que trabalha para finalizar acordo nacional avaliado em mais de US$ 4,2 bilhões e, Nova York, estava programada para receber medicamentos e dinheiro como parte do acordo. A Procuradora-geral de Nova York, disse que o acordo da Teva conclui o litígio contra fabricantes e distribuidores de opioides, enquanto a CVS Health Corp, a Walgreens Boots Alliance e o Walmart concordam pagar US$ 13,8 bilhões para resolver processos estaduais e locais relacionados opioides dispensados por suas farmácias. A Teva propôs em julho de 2022 acordo nacional de US$ 4,25 bilhões,  em dinheiro e parte medicamentos que totalizarão US$ 300 milhões a US$ 400 milhões em 13 anos, para resolver processos relacionados a opioides, sendo que o acordo de Nova York paga em 18 anos. Por fim, ordem do juiz distrital em Cleveland marca a primeira vez que redes de farmácias são condenadas a pagar em processo de opioides, depois que um júri em novembro de 2022 concluiu que ajudaram criar incômodo público nos condados de Lake e Trumbull ao fornecer comprimidos analgésicos opioides, muitos dos quais chegaram ao mercado negro, além do que, a Walgreens foi considerada responsável em processo de opioides movido por San Francisco, embora o juiz não tenha determinado quanto deve pagar. A epidemia de opioides nos EUA causou mais de 500 mil mortes por overdose em 20 anos, dados do governo, mais de 3.300 ações movidas por governos locais, acusando fabricantes de medicamentos, distribuidores e redes de farmácias de alimentar a crise. O litígio resultou em acordos nacionais, incluindo US$ 26 bilhões com a Johnson & Johnson e três distribuidores, um acordo de US$ 2,37 bilhões com a AbbVie Inc e um de US$ 4,25 bilhões com a Teva Pharmaceutical Industries Ltd.


domingo, 6 de fevereiro de 2022

Guerra e paz

Após 150 anos da guerra civil americana o país enfrenta nova epidemia de drogas iniciada na década de 1990 e, segundo dados recentes, deixou mais de 100 mil mortos por overdose entre abril de 2020 e abril de 2021. Historiadores traçam paralelos nas duas crises pelo fato de ambas iniciarem com medicamentos legais prescritos por médicos, se estendendo por várias décadas e deixando milhares de mortos. Jonathan Jones, professor do Instituto Militar da Virgínia, pesquisou arquivos médicos, diários pessoais, registros de serviço militar e pedidos de pensão, entre outros documentos do século 19, reconstruindo vida e morte de 200 soldados dependentes químicos na Guerra Civil e concluindo que "a maioria morreu de causas ligadas ao abuso de opioides", sendo que o estudo da origem e impacto da crise resultou no livro Opium Slavery, 'Civil War Veterans and America's First Opioid Crisis' ou "Escravidão do Ópio, Veteranos da Guerra Civil e a Primeira Crise de Opioides da América" livro a ser lançado em 2023. No entanto, nos informa que os "opioides eram amplamente usados nos EUA antes da Guerra Civil", sendo que no século 19, ópio e substâncias derivadas, como morfina e láudano, mistura de ópio e álcool, eram medicamentos comuns no país e assemelhados, vendidos sem restrições e recomendados por médicos para tratar problemas de saúde, como cefaleias, cólicas menstruais, febre, tosse, diarreia e insônia, podendo ser consumido sob forma injetável, pó ou comprimidos. Ressalva que as substâncias eram legais, acessíveis e baratas, serviam como ingrediente à outros remédios, comercializadas em lojas de departamentos como  Sears ou Roebuck & Co, podendo encomendar kits com a droga e seringas e receber a mercadoria pelo correio, sendo que "só no início do século 20 os narcóticos começaram a ser regulados nos EUA".

A disseminação da utilização dos opioides se evidencia no início da Guerra Civil, em 1861, quando principalmente a morfina, passam a ser amplamente usados para aliviar dor dos feridos explodindo o número de prescrições. Fato é que o conflito entre União e Estados Confederados deixou mais de 700 mil mortos com sobreviventes lutando por superar ferimentos graves, amputações e sequelas permanentes, além das péssimas condições sanitárias dos campos de batalha levando a diarreia, disenteria e doenças que debilitavam os soldados, muitas vezes fatais, também tratadas com opioides. Em decorrência, soldados usavam as substâncias para se automedicar e combater medo e estresse antes das batalhas, conforme afirma Jones que "milhões de soldados da Guerra Civil sofreram problemas físicos, ferimentos a bala, amputações, lesões traumáticas e não havia muito o que os médicos pudessem fazer além de oferecer analgésicos". O cirurgião Silas Weir Mitchell, do hospital Turner's Lane, na Filadélfia, escreveu que em apenas um ano cerca de 40 mil injeções de morfina foram aplicadas em soldados naquele estabelecimento, com altas doses de morfina três vezes/dia. Segundo o manual, cirurgiões militares deveriam usar opioides para aliviar a dor dos feridos, tratar de vômitos, diarreias, sangramentos internos, inflamação de ferimentos a bala e espasmos musculares nos amputados e até mesmo para sedar pacientes.

Moral da Nota: ao retornarem à casa, continuaram usar morfina e outros opioides para aliviar dores e problemas crônicos resultantes da guerra, sendo que "muitos desses ferimentos nunca foram curados, eram lesões que causaram dor para o resto da vida", sendo que relatório da comissão de saúde do Estado de Massachusetts em 1872 afirmou que "soldados que adquiriram o hábito em hospitais militares ainda estão dependentes do uso de ópio". Em 1889, 25 anos depois do fim da guerra, James Adams, médico, escreveu sobre o "grande número" de veteranos que com diarreia crônica e "como era de se esperar, se tornaram comedores de ópio" e, muitos que se curaram completamente dos ferimentos e doenças contraídas na guerra, já estavam dependentes e mantiveram o uso de opioides, facilmente obtidos sem restrições. Após a guerra, o problema tornou-se epidemia de proporções nacionais, não havendo números exatos, mas, historiadores relatam que centenas de milhares de americanos enfrentavam dependência de opioides no final do século 19, com o detalhe da crise afetar a população geral especialmente mulheres, sendo que a atenção da imprensa e da sociedade se concentrava nos ex-soldados dependentes. O drama dos soldados provocava críticas, como ex-combatentes, antes respeitados pelos sacrifícios na guerra, passaram a ser humilhados e vistos como imorais, fracos e sem força de vontade para deixar o vício, sendo que overdoses eram noticiadas como culpa dos dependentes. Supostas curas para dependência se transformaram em indústria milionária com produtos como o “antídoto” S. B. Collins anunciado nos jornais, além de muitos tentar se livrar da dependência por conta própria e, não suportando sintomas da abstinência, recaiam, algo recriminado pela sociedade da época. "Por volta de 1890, a situação começou a mudar com a sociedade passando a ser mais solidária com os veteranos dependentes" e, segundo Jones, "época que o governo americano começou a proibir o uso de ópio entre imigrantes chineses" lembrando da substituição dos ex-soldados por chineses como alvo das críticas da sociedade. O Historiador conclui que "gradualmente, o governo, médicos e ativistas de proteção ao consumidor adotaram medidas de auxílio na solução da epidemia, tarde demais aos veteranos da Guerra Civil".