quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

Inconveniência

Na Índia, África do Sul, Alemanha, Nova York e Canadá inundações mataram em 2024, secas modificam paisagens e murcham plantações no oeste dos EUA, chifre da África e Iraque, com extremos climáticos revelando dura verdade, escolhas de desenvolvimento, expansão urbana, agricultura industrial e infraestrutura de concreto projetada para controlar água acabam por exacerbar os problemas. A água parece maleável e cooperativa, disposta a fluir para onde a direcionamos, mas, à medida que o desenvolvimento se expande e o clima muda, cada vez mais inunda cidades ou cai a profundidades abaixo das fazendas tornando a vida precária, daí, cursos de água vencidos surgem em lugares inconvenientes em que riachos sazonais emergem em porões mostrando evidências que as casas invadem córregos  enquanto construídas em áreas úmidas sendo as primeiras inundar.Para reduzir o impacto das secas e inundações mais frequentes e severas da atualidade, grupo de "detetives da água", ecologistas de restauração, hidrogeólogos, biólogos, antropólogos, planejadores urbanos, arquitetos paisagistas e engenheiros fazem pergunta crucial, ou, o que a água quer? Acomodar esses desejos em nossas paisagens é estratégia de sobrevivência, com os  detetives da água começando descobrir o que a água fez antes que gerações de humanos transformassem as paisagens e cursos d'água e, à medida que fazem descobertas, começamos entender por que áreas inundam repetidamente, ou como a tendência de acelerar água da terra nos priva da chuva local, daí, pensamos sobre como resolver os problemas, abrindo espaço à água dentro nos habitats existentes. As respostas encontradas em cidades, campos, pântanos, planícies, montanhas e florestas são que deveríamos conservar ou reparar sistemas naturais, ou, imitar a natureza para restaurar funções naturais não construindo mais infraestrutura concreta, abordagens reparadoras como sistemas baseados na natureza, infraestrutura verde, desenvolvimento de baixo impacto, design urbano sensível à água. 

O movimento Slow Food fundado na Itália em fins do século XX, em oposição ao fast food e seus males cujas abordagens são personalizadas e trabalham com paisagens, climas e culturas locais, em vez de tentar controlá-los ou alterá-los, visa preservar culturas alimentares locais chamar a atenção das pessoas à origem de seus alimentos e como a produção afeta pessoas e ambiente. O Slow Water chama atenção ao modo pelas quais a aceleração da água em direção à terra causa problemas, cujo objetivo é restaurar fases naturais e apoiar disponibilidade local, controle de enchentes, armazenamento de carbono e diversidade de modos de vida, quer dizer, o Slow Food é local apoiando agricultores locais e protegendo terras rurais do desenvolvimento industrial de uma região, ao mesmo tempo reduzindo kms de transporte de alimentos e pegada de carbono,idealmente, o Slow Water o é. Dessalinizar e transportar água consome energia, na Califórnia, por exemplo, bombas gigantes que empurram água do Delta do Sacramento ao sul são consumidoras de eletricidade do estado e retirar água de uma bacia e movê-la à outra pode esgotar o ecossistema doador ou introduzir espécies invasoras no receptor, daí, engenharia hídrica também ser questão de justiça ambiental. Entre 1971 e 2010, 20% da população mundial obteve água de intervenções em rios, incluindo represas, e 24% ficaram com menos água, conforme estudo de 2017 e, trazer água de outros lugares pode prejudicar pessoas que a recebem com um novo reservatório transmitindo sensação de segurança quando vivemos a longas distâncias da fonte de água e não compreendemos limites do supriment, o que nos torna menos propensos a conservá-la. O expandir populações humanas em locais onde não há água como no sudoeste dos EUA, no sul da Califórnia e Oriente Médio, tornamos esses lugares e as pessoas mais vulneráveis ​​a quedas no suprimento em que transferências de água criam ciclo de escassez semelhante ao modo como adicionar mais faixas a rodovia atraindo mais carros. Por fim, o Slow Water está no espírito de tradições indígenas em que não consideram a água um "o quê", uma mercadoria ou ameaça, mas um "quem", enquanto povos indígenas ao redor do mundo acreditam não apenas que a água é viva, mas que é parente, "tipo de orientação transformando o modo como tomamos decisões sobre como podemos proteger a água". A expansão urbana agrava a escassez de água na China, especialmente no norte e oeste, em cidades mais densamente povoadas devido à chuva que escorre de estacionamentos, prédios e ruas, cerca de 20% da precipitação penetra no solo, com Pequim, Cidade do México e Vale de San Joaquin, na Califórnia, levando ao esgotamento dos aquíferos subterrâneos por retirada urbana e, globalmente,as inundações urbanas tornaram-se graves, visto que a área terrestre coberta por cidades no mundo dobrou desde 1992 com  pesquisadores da Universidade Johns Hopkins calculando como superfícies impermeáveis ​​aumentam inundações e, cada vez que uma cidade aumenta a cobertura de solo absorvente com estradas, calçadas ou estacionamentos em 1%, o escoamento aumenta a magnitude anual das inundações em cursos d'água próximos em 3,3%. 

Moral da Nota: estudo argumenta que o caminho para alimentar a crescente população africana que chegará a 2.5 bilhões até 2050 não precisa agravar a crise climática,entre 2000 e 2021, as emissões agrícolas e alimentares da África aumentaram 40% levando os sistemas agrícolas e alimentares à uma encruzilhada. Revela que fazendas, indústrias alimentícias e florestas do continente emitem quase 2,9 bilhões de toneladas de CO2 equivalente a cada ano, mais de um quarto das emissões globais do sistema alimentar, no entanto, liderado por pesquisadores da Universidade Agrícola da China e da Aliança da Biodiversidade Internacional e CIAT, argumenta que as emissões agrícolas e alimentares aumentaram 40%, de 2,03 para 2,85 gigatoneladas de CO2 equivalente e grande parte desse aumento decorre da expansão de terras agrícolas e rebanhos de gado, particularmente na África Oriental e Central. A Bacia do Congo, 2ª maior floresta tropical do mundo, continua perder milhões de hectares de floresta primária, enfraquecendo um dos maiores sumidouros de carbono da Terra e ameaçando meios de subsistência rurais com o estudo ressaltando que a África não é apenas um sistema agrícola, mas a soma de muitos, com ativistas protestando contra danos ambientais causados ​​por resíduos plásticos na semana global de ação climática no Senegal. As soluções devem se adequar às realidades locais, ou, proteger florestas, gerenciar água e nitrogênio nas regiões produtoras de arroz, melhorar alimentação e saúde do gado e modernizar logística próximo das cidades para reduzir desperdício de alimentos, quer dizer, o sistema agroalimentar da África emite quase 2,9 bilhões de toneladas de CO2, por exemplo, umedecimento e secagem, AWD, em arrozais testados na Ásia e África Ocidental podem reduzir emissões de metano em até 47% e economizar 30% da água de irrigação sem diminuir produtividade. Na pecuária,forragens, suplementos minerais e cuidados com animais reduzem o metano por quilo de carne ou leite, ao mesmo tempo que aumentam a produtividade, o desmatamento, segundo o estudo, é a maior fonte de emissões agrícolas na África Central e Ocidental e sua contenção deve andar de mãos dadas com incentivos econômicos, direitos de terra seguros, pagamentos por serviços ecossistêmicos, cadeias de suprimentos e desmatamento zero ao cacau, café e óleo de palma. A pegada oculta de fertilizantes, transporte e perdas pós-colheita está aumentando e  até 30 % dos alimentos nas cadeias de valor são perdidos entre a fazenda e o mercado, desperdiçando calorias e carbono, daí, expandir o armazenamento a frio solar, melhorar acesso rodoviário e logística ajudam conter perdas. Por fim, pesquisadores estimam que a África precisará de US$ 50 bilhões anuais até 2030 para financiar  agricultura climaticamente inteligente, aumentando práticas comprovadas à 20 % gerando ganhos imediatos ao clima, a renda e a segurança alimentar.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2025

O Rio Sena

Históricamente conhecido pelo nível de poluição, o rio Sena em quase um século foi proibido nadar pelos elevados níveis de bactérias e outros contaminantes, no entanto, os Jogos Olímpicos 2024 trouxeram a mobilização necessária à França empreender projeto de saneamento em investimento de mais de US$ 1,5 bilhão, esforço que procurou transformar o Sena em local seguro às competições aquáticas, desafio que se revelou mais complexo que o esperado. Foram implementadas tecnologias de tratamento de águas residuais, dentre elas, a filtração por membranas e o uso de bactérias benéficas para decompor contaminantes, técnicas críticas não só à eventos de grande escala, mas à gestão diária de águas residuais urbanas no mundo, no entanto, a qualidade da água do rio permanece inconsistente pós fortes chuvas que despejam esgotos no rio. A questão veio à tona quando dois nadadores de triatlo, Claire Michel, da Bélgica, e Adrien Briffod, da Suíça, adoeceram depois de competir no rio, com Michel se retirando da competição de revezamento misto devido doença não especificada, enquanto Briffod desenvolveu infecção gastrointestinal, embora não tenha sido confirmado que as doenças estejam diretamente relacionadas com a qualidade da água do Sena com a coincidência suscitando dúvidas entre atletas e organizadores. Chuvas em Paris mostraram como acontecimentos climáticos afetam níveis de poluição em que tecnologias preditivas em dados podem fazer diferença cujos sistemas de análise podem antecipar eventos climáticos e planejar respostas eficazes, minimizando impacto na qualidade da água, com cidades inteligentes utilizando estes sistemas para gerir infraestruturas e mitigar efeitos adversos do clima, já que as chuvas não só estragam a aparência do rio mas trazem poluentes que colocam em risco a saúde. Vale a nota que no passado houveram esforços para limpar rios e melhorar a qualidade da água, tentativas que variaram em abordagem e tecnologia adaptando-se às necessidades e conhecimentos da época, com a humanidade reconhecendo a importância da água limpa, civilizações indígenas desenvolvendo métodos de tratamento de água em harmonia com a natureza através de sedimentação e filtração, embora tais práticas sejam subestimadas e nem sempre documentadas devido à marginalização destas culturas, no Império Romano construíram aquedutos, sistemas que transportavam água limpa de fontes distantes às cidades, essenciais para manter higiene e abastecimento e sua queda marcou retrocesso em tecnologias de tratamento de água com inovações esquecidas. A Revolução Industrial transformou os rios em depósitos de resíduos industriais com o rio Cuyahoga, em Cleveland, se incendiando pelo menos 13 vezes devido poluição de petroquímicos e, em 1969, se atentou à necessidade de regular a poluição da água levando à promulgação nos EUA da Lei da Água Limpa em 1972, lei que estabeleceu padrões à qualidade da água e regulamentou descargas de poluentes em rios, marco na legislação ambiental buscando transformar rios altamente poluídos em recursos mais limpos e seguros.

O Sudeste Asiático abriga as maiores áreas de turfeiras tropicais e manguezais do mundo, na Índia e Bangladesh, com regiões que podem armazenar mais de 90% do carbono em solos em vez de vegetação, compartilhando solos de água com oxigênio limitado que retardam a decomposição da matéria orgânica, tornando-os sumidouros de carbono mais eficazes, embora ocupem 5% das terras da região, desempenham papel importante nas metas de redução de emissões e fazem esforço crucial para atingir as metas climáticas dos países da ASEAN. Estudo publicado na Nature Communications destaca benefícios significativos da conservação e restauração de turfeiras e manguezais, sendo que a meta de mitigar emissões de carbono não será alcançada se forem destruídas ou interrompidas devido a mudanças no uso da terra e períodos de seca, como o El Niño, que pode prejudicar a qualidade do ar em países como Singapura. Fornece estimativas de emissões de turfeiras e manguezais com o professor associado Massimo Lupascu, pesquisador principal do estudo, explicando que, “se conservássemos e restaurássemos as turfeiras e os manguezais densos em carbono no Sudeste Asiático, poderíamos mitigar 770 megatoneladas de CO2 equivalente, MtCO2e, anualmente, ou, quase o dobro das emissões nacionais de gases efeito estufa da Malásia em 2023.” Enquanto o professor David Taylor, coautor, destaca importância de incluir esses ecossistemas nas NDCs do Acordo de Paris, esclarecendo que, “incluir turfeiras e manguezais nas Contribuições Nacionalmente Determinadas, NDCs 3.0, que os países signatários do Acordo devem atualizar e se comprometer a cada 5 anos, pode contribuir para aumentar o estabelecimento de metas mais altas de redução de emissões, embora envolva investimentos em conservação e restauração eficazes.”O estudo fornece estimativas atualizadas de emissões de turfeiras e manguezais perturbados no Sudeste Asiático de 2001 a 2022, discriminadas por tipo de uso da terra e país, dando aos formuladores de políticas dados para identificar pontos críticos à intervenção e priorizar esforços de conservação, considerando que os manguezais podem reduzir as emissões de carbono no Sudeste Asiático em 50%, considerando que, mais de 90% do carbono é armazenado no solo em vez da vegetação, tornando-os sumidouros naturais de carbono do mundo.

Moral da Nota: são descartados 5,7 milhões de tubos de pasta de dente, 570 mil celulares e 2,3 milhões de pares de tênis a cada hora, sendo que a produção de plásticos é insustentável, prejudicial à saúde e cresce exponencialmente, considerando que a reciclagem, "na melhor das hipóteses, consome energia" no descarte de plásticos no ambiente que contêm milhares de produtos químicos, grande parte não testados, provavelmente tóxicos enquanto os que conhecemos se associam do autismo e TDAH à infertilidade e diabetes. Novas regras propostas pela Agência de Proteção Ambiental dos EUA que restringiriam ou proibiriam  produtos tóxicos usados ​​na fabricação industrial, foram apresentados como "escolha difícil" à Casa Branca que busca equilibrar agenda econômica e saúde pública em que o enquadramento “saúde pública versus crescimento econômico” é inútil e demonstravelmente falso, sendo a única “escolha difícil” a ser feita é se devemos continuar com um modelo ultrapassado e tóxico que beneficia algumas empresas regressivas ou focar na inovação em química que alcança concorrentes no exterior e economiza nas contas médicas. Relatório publicado no Annals of Global Health estima que em 2015 os custos relacionados à saúde da produção de plástico, o uso mais comum da fabricação de produtos químicos industriais hoje, excederam US $ 250 bilhões globalmente, somente nos EUA, os custos anuais de saúde de doenças e incapacidades causadas por 4 produtos químicos industriais, PBDE, BPA, DEHP e PFAS, se aproximam de US$ 1 trilhão considerando que há mais de 86 mil produtos químicos industriais em circulação parecendo provável que os custos reais de saúde sejam muito maiores. Estudo de 2015 publicado pelo Lancet Group estimou que o custo de doenças mediadas pela exposição a produtos químicos desreguladores endócrinos nos EUA poderia exceder US$ 340 bilhões anualmente, sendo que um estudo de coorte de 2022, populacional, usou dados históricos para vincular a exposição a ftalatos nos EUA a 100 mil mortes prematuras e US$ 40 bilhões resultantes em custos sociais anuais. Estudo de 2022 da Universidade de Lund, na Suécia, descobriu que os petroquímicos respondem ​​por um décimo das emissões globais de gases efeito estufa quando os pesquisadores avaliam seu ciclo de vida completo, que pode incluir tudo, de um poço de fracking na Pensilvânia a uma jangada de isopor se desintegrando no meio do Oceano Pacífico, com a Fundação Minderoo publicando análise que mostra emissões de gases efeito estufa do berço ao túmulo apenas de plásticos, um subconjunto do uso total de petroquímicos, aproximadamente equivalente às emissões anuais da Rússia. A indústria de plásticos e petroquímicos sabe dos efeitos nocivos à saúde de seus produtos há décadas, em 1970, pesquisas mostraram que compostos da família química PFAS forever bioacumulam no corpo humano e representam riscos  à saúde, no entanto, em vez de remover os produtos químicos do uso e desenvolver alternativas seguras, a indústria dobrou a defesa de seus produtos, resultando hoje na contaminação universal por PFAS que pode ser encontrada em todos os americanos.