terça-feira, 4 de abril de 2023

O Ártico

Estudos suecos alertam que o Oceano Ártico aquece mais rápido que o previsto por modelos climáticos da ONU, acelerando derretimento do gelo marinho. Estudos da Universidade de Gotemburgo publicados no Journal of Climate, explicam que correntes quentes do Ártico profundo são mais quentes e mais próximas da superfície entrando em contato direto com o bloco de gelo e acelerando o derretimento do inverno. Compararam as observações com cálculos de 14 modelos considerados pelo IPCC, Painel Intergovernamental de Especialistas em Mudanças Climáticas da ONU, que elabora os principais relatórios sobre o clima, sendo que a influência das águas profundas que circulam no Ártico a partir do Atlântico é subestimada. Um dos estudos avalia que a superfície do bloco de gelo diminuiu em média 9% no inverno e 48% no verão desde as primeiras fotografias de satélite em 1979, daí, a espessura diminuir 66% e, em 2022, enquanto outro estudo revelou que a atmosfera no Ártico aqueceu 4 vezes mais rápido que em qualquer outro lugar nos últimos 40 anos, o dobro da taxa fornecida pelos modelos do IPCC.

Neste quadro, o presidente Biden prometeu não permitir novas perfurações de petróleo e gás em terras federais, reforçando compromisso com o Acordo Climático de Paris, daí,  a decisão de seu governo de aprovar o projeto de petróleo Willow no Alasca é considerada contraditória porque afeta o habitat de comunidades nativas e contrárias ao projeto. O projeto de petróleo Willow é a maior extensão de terra pública não perturbada dos EUA, portanto, a decisão de aprovar um projeto de petróleo no Alasca, localizado em área conhecida como Reserva Nacional de Petróleo em terras do estado pode afetar comunidades indígenas que se opõem ao projeto. Os legisladores do Alasca e patrocinadores do projeto dizem que Willow cria empregos e contribui à independência energética dos EUA esperando-se produção máxima de 180 mil barris de petróleo/dia, no entanto, organizações ambientais e comunitárias nativas se opõem e,se concretizado, será administrado pela ConocoPhillips, multinacional norte-americana de extração, transporte e processamento de petróleo, prevendo 3 áreas de perfuração das 5 solicitadas pela empresa, com aproximadamente 219 poços. A meta é produzir 576 milhões de barris de petróleo em 30 anos, estimativas do Bureau of Land Management, BLM, e a emissão de 9,2 milhões de toneladas de CO2/ano, que representa 0,1% das emissões de gases efeito estufa nos EUA em 2019. Aprovado no governo de Trump, o projeto de petróleo Willow foi interrompido por um juiz em 2021 e nova revisão do governo Biden o reanimou pretendendo proibir perfuração de grande área do Ártico que faz fronteira com a Reserva Nacional de Petróleo Christy, ao passo que a diretora de impacto de políticas do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais, disse  “é um erro grave dar luz verde a uma bomba de carbono, atrasando a luta climática e encorajando indústria determinada  destruir o planeta. Errado no clima e errado ao país.” Grupos ambientalistas lutaram para bloquear a aprovação de Willow e, no processo, motivaram jovens americanos participar de campanha nas redes sociais para se opor, via petição no site Changeorg,  atraindo 3,2 milhões de assinaturas. A invasão da Ucrânia pela Rússia complicou a decisão após embargos ao petróleo e ao gás russo disparando preços da energia quando executivos do petróleo na conferência do setor em Houston argumentarem que rejeitar Willow seria hipócrita. A decisão dividiu comunidades nativas do Alasca com líderes do vilarejo de Nuiqsut, mais próximo do projeto, se opuseram dizendo que ameaçava a saúde pública e a caça de subsistência, no entanto, outras comunidades nativas apoiaram o desenvolvimento. Willow certamente terá impactos locais e nos primeiros anos de desenvolvimento, exigirá viagens de caminhão no inverno e primavera, de acordo com a declaração de impacto ambiental, poluindo área com exaustão de diesel,  que algumas pessoas atribuíram aumento na incidência de doenças respiratórias à perfuração em projeto separado a alguns kms ao norte e um segundo a oeste, sendo que Willow adicionaria um terceiro, além do local existente a oeste.

Moral da Nota: o novo livro da escritora dinamarquesa Dorthe Nors, “A Line in the World”,  narra um ano de viagens ao longo da ameaçada costa do Mar do Norte. Quando a escritora era criança na Dinamarca, teve encontro com o Mar do Norte,  momento que ficaria com ela pelo resto de sua vida, dizendo que  “estava segurando a mão da minha mãe”,  escreve, em “A Line in the World” “enquanto caminhávamos pela praia, deixando as ondas baterem em nossos tornozelos, um deles me arrastou para fora.” Em “A Line in the World” explora contradições que capta de modo nítido com a mudança climática pairando nas bordas de “uma linha no mundo” como um espectro e o aquecimento global alimentam tempestades e ressacas pelas quais a região é famosa, tornando-as intensas e frequentes. No Mar do Norte, a mudança é  constante, suas praias e ilhas são sempre refeitas pelo vento e água, durante séculos o mar engoliu marcos icônicos, casas, cargas de navios, cidades inteiras mas a mudança climática deu início a uma era de extremos artificiais. O livro narra viagem ao longo desta costa deslumbrante, para ilhas, cidades, praias, igrejas e trilhas que se estendem ao longo da fronteira oeste da Dinamarca de norte a sul e na Alemanha, conta histórias de vilas de pescadores tradicionais, rotas vikings, afrescos religiosos, naufrágios e uma área chamada Cold Hawaii atraindo surfistas em busca de emoção. As andanças de Nors incorporam história, língua e cultura, embora seu tema central seja o lugar e o mundo natural, se preocupa em desvendar a relação nodosa e tensa entre a costa específica e as pessoas que ali vivem. “Uma Linha no Mundo” ilustra como a natureza pode ser lida como registro do passado e os lugares contêm memórias de todo aquele desejo, escreve, todas aquelas memórias fugazes de dias ao sol e tempo passado com entes queridos, picadas de água-viva, pipas e tempestades. Embora a mudança climática assuma o Mar do Norte, Nors disse que não queria que a crise ocupasse o centro do livro, “queria escrever sobre este lugar e sua beleza com amor, em vez de dizer que já está morto por causa do apocalipse”.