sábado, 2 de novembro de 2024

Biodiversidade

A ex-vice-ministra Sandra Vilardy descreve a COP como um sucesso ao “elevar o papel e o valor da natureza, um apelo à ação, uma COP que reconheceu e incluiu vozes respeitando direitos, uma COP que unisse agendas da biodiversidade e alterações climáticas”, com Sandra Valenzuela, diretora da WWF Colômbia, pedir a quem estava negociando mais ambição", no entanto,  povos indígenas, estiveram no centro, ao passo que “ter aprovado programa de trabalho é avanço, pois estabelece tarefas e ações específicas que os povos indígenas devem realizar para conservar a biodiversidade e, mais importante que isso, dita tarefas aos estados à apoiar e incentivar atividades”, segundo o copresidente do Fórum Indígena Internacional sobre Biodiversidade. Prevaleceu bloqueio entre em desenvolvimento e ricos sobre financiamento, sendo que a falta de acordo neste ponto relegou a 2º plano o planejamento que os países deveriam estabelecer para impedir a destruição da biodiversidade até 2030, com a presidente colombiana da 16ª Conferência da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica, CDB, Susana Muhamad, esclarecendo que "é negociação complexa, com muitos interesses, muitas partes, significa que todos têm de abrir mão de algo".  Dois anos pós acordo Kunming-Montreal sobre o tema, a COP 16 intensificou esforços para aplicar roteiro destinado a salvar o planeta e os seres vivos do desmatamento, exploração descontrolada, mudanças climáticas e poluição, todas provocadas pelo homem, que prevê 23 objetivos a serem alcançados até 2030, colocando 30% dos territórios e mares em áreas protegidas, reduzindo pela metade riscos dos agrotóxicos e da introdução de espécies invasoras, além de reduzir em US$ 500 bilhões/ano os subsídios prejudiciais à agricultura intensiva ou aos combustíveis fósseis, prevendo aumento dos gastos anuais com a natureza, à US$ 200 bilhões, deste montante, países desenvolvidos comprometeram-se aumentar sua ajuda anual à US$ 30 bilhões em 2030, comparados a US$ 15 bilhões em 2022, segundo a OCDE. Aí começa o impasse, países em desenvolvimento exigem criação de um novo fundo, colocado sob autoridade da COP, mais favorável aos interesses da biodiversidade que os atuais fundos multilaterais, como o GEF, Fundo Mundial para o Ambiente, considerados de difícil acesso,  por outro lado, países ricos, em particular a UE já que EUA não são signatários da convenção, consideram contraproducente a multiplicação de fundos que fragmentam a ajuda e, sem fornecer dinheiro novo que deve ser encontrado, segundo eles, no setor privado e em países emergentes.

Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, ressaltou que as promessas estão longe de terem sido cumpridas dizendo que  "o financiamento está aquém do que foi o compromisso assumido de US$ 20 bilhões/ano, para viabilizar o que comprometemos relativos à redução de perda de biodiversidade, preservação, restauração e uso sustentável da biodiversidade“, ressaltando que, “existe necessidade de mudança nos mecanismos de financiamento, que não atingem ambições do Sul Global e de países biodiversos, que não se sentem representados da forma como tem sido operacionalizados os mecanismos“.  Vale dizer que, os embates devem se repetir, com montantes 10 vezes superiores, na COP29 sobre o clima em Baku, no Azerbaijão, já que na COP17 da biodiversidade na Armênia daqui a 2 anos, os países deverão fazer balanço e possivelmente reforçar medidas, no entanto, credibilidade dos compromissos depende de regras negociadas em Cali e que não alcançam consenso, ainda que 6 anos antes da meta de 2030, 44 dos 196 países estabeleceram plano nacional para sinalizar como pretendem implementar o acordo e 119 apresentaram compromissos sobre a totalidade ou parte dos objetivos, conforme contagem oficial. As discussões tropeçaram na adoção de mecanismo para que os lucros das empresas, cosmética e farmacêutica, por sequenciamentos genéticos digitalizados, DSI, de plantas e animais, sejam compartilhados com comunidades que as preservaram, com o detalhe que “não é  doação, é pagamento legítimo”, conceito defendido por Marina Silva, ministra do Meio Ambiente do Brasil, valendo ainda dizer que países debateram a concessão de estatuto oficial para reforçar, na CDB, povos indígenas, guardiões de territórios preservados, ricos em biodiversidade, entretanto, Rússia e Indonésia bloquearam sua adoção, segundo a presidência do evento. A perda de biodiversidade e o colapso dos ecossistemas ameaçam o bem-estar global, neste cenário, o setor empresarial desempenha papel na complementação de esforços do setor público e da sociedade na proteção e conservação dos recursos naturais, em consequência, GRI, nuam e PwC desenvolveram relatório avaliando nível de maturidade das ações relativas à proteção da biodiversidade das empresas cotadas nos mercados de capitais conforme informação divulgada nos relatórios de sustentabilidade de 2023, com Margarita Casas, sócia de Sustentabilidade e Mudanças Climáticas da PwC Colômbia, mencionando que “o relatório público sobre gestão da biodiversidade não é um fim em si mesmo, mas parte de processo de melhoria que ajuda organizações entender onde estão e o que podem melhorar.” O estudo realizado com modelo IA e motor conversacional para análise de relatórios de sustentabilidade, desenvolvido pela PwC, inclui práticas e recomendações às empresas cotadas e não cotadas sobre como reforçar a gestão e reporte no tema, sendo que os resultados mais relevantes do estudo indicam que divulgações mais avançadas incluem políticas e compromissos relativos à biodiversidade e relacionados a inovação e melhoria contínua. Carlos Barrios, Gerente de RI e Sustentabilidade na nuam, concluiu dizendo que “a perda da biodiversidade cresce no mundo e constitui risco à estabilidade do mercado de capitais, razão pela qual devem agora não apenas ser Net Zero, mas Nature Positive e, no relatório, mostramos que o setor energético dos 3 países onde a Nuam opera é o que mais avançou na menção à biodiversidade nos seus relatórios, colocando-a em estatuto intermédio e começar reportar a biodiversidade nas empresas é exemplo de boa prática, já que, na nuam estes relatórios devem começar de forma voluntária, agora o desafio dos emitentes e das empresas em geral é continuar aprender e reportar a biodiversidade, tendo líderes, incluindo investidores, impactados por ela”. 

Moral da Nota:  o término da 16ª Conferência da ONU sobre a Diversidade Biológica deixou impasse sobre a delicada questão da repartição dos benefícios genéticos da natureza, com países diversos, como o Brasil, insistindo na criação de mecanismos justos de compensação pelo uso desses recursos naturais com os quais, multinacionais agroalimentares, farmacêuticas e cosméticas fazem fortunas nos países desenvolvidos, por exemplo, o sequenciamento genético digital, DSI, de plantas, animais e microrganismos, à disposição da comunidade científica, dispensa que sejam extraídos diretamente da natureza para serem utilizados pelas indústrias e pela academia, em pesquisas científicas. Indústrias farmacêutica e cosmética estão entre as que mais desenvolvem produtos a partir de bancos de sequenciamento genético de plantas, animais e microrganismos, sendo que os 3 principais bancos de dados ficam na Inglaterra, Japão e EUA,  configuração que obriga as 193 nações signatárias da Convenção sobre Diversidade Biológica, assinada em 1992, encontrarem novos meios de retribuir os países que abrigam e conservam estes recursos na natureza, sendo que a repartição dos benefícios prevista no Protocolo de Nagoya, de 2010, cujo documento se aplica apenas ao material genético físico e, na última COP, em 2022, ao assinarem o Marco Global da Biodiversidade, os países concordaram com a criação de mecanismo multilateral à repartição dos benefícios “incluindo fundo global” e, até agora, não chegaram a um consenso. Na mesa, alternativas como instauração de taxa de até 1% sobre o valor de varejo destes produtos, ou, percentual inferior sobre lucros anuais das multinacionais que utilizam sequenciamentos genéticos da natureza, em aberto como esta compensação seria efetivada, se através de projetos específicos de proteção da biodiversidade ou por financiamento direto aos países detentores das riquezas, valendo dizer que, Brasil e Colômbia abrigam a maior área de floresta tropical e maior biodiversidade do mundo, além de países africanos e do sudeste asiático, sendo que a negociação envolve comunidades locais e indígenas que preservam muitos destes recursos. Por fim, um dos argumentos dos lobbies e de alguns países ricos para não compensar financeiramente países florestais é que são eles próprios que sustentam a existência dos bancos de dados genéticos, para benefício da comunidade internacional, outros, como a Suíça e Japão, batalham para que a repartição dos benefícios seja voluntária, alternativa rejeitada pelos países em desenvolvimento.

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Crédito de Carbono

O mercado de créditos de carbono marca a estréia da Amazon com plataforma brasileira de reflorestamento em parceria com 2 startups fundadas por brasileiros para lançar a Sabiá, plataforma que incentiva reflorestamento por meio de agroflorestas com recompensas em créditos de carbono, avaliada em US$ 1,9 trilhão, com a Amazon  abrindo frente de negócios no mercado de créditos de carbono com as startups Belterra e BovControl. No lançamento oficial da Sabiá, plataforma de aceleração de agroflorestas e restauração ambiental que oferece treinamento especializado, acesso a mercados e recompensas em créditos de carbono a pequenos e médios agricultores, a startup criada por brasileiros anunciou tokens de crédito de carbono com ganho de até 20% sobre resíduos de compostagem, inicialmente, as operações se concentrarão em plantações de cacau e culturas agroflorestais no Pará e, no futuro, será expandido ao restante do Brasil e, posteriormente, replicado em outros países. A Belterra fornecerá treinamento, assistência técnica e insumos aos agricultores, enquanto a BovControl cuidará do desenvolvimento e gestão da plataforma com financiamento da Amazon respondendo por garantir validação, verificação, emissão e compra dos créditos de carbono vinculados ao programa, assim, a empresa se  posiciona como market maker, formadora de mercado, em setor que deve movimentar US$ 120 bilhões até 2030, segundo a ICC, Câmara de Comércio Internacional, e a consultoria de sustentabilidade WayCarbon sendo que o programa oferecerá compensações aos agricultores entre US$ 5 e US$ 30 por tonelada de carbono sequestrada. O modelo de negócios da Sabiá prevê que 20% dos créditos de carbono gerados na propriedade serão destinados à Amazon para cobrir custos operacionais de monitoramento e gestão do programa, sendo que o restante caberá aos proprietários das terras, enquanto parte dos créditos poderá ser trocada por bens ou serviços com a própria Amazon, ou, negociada no Acelerador de Agroflorestas e Restauração, gerando renda extra aos agricultores, com a Sabiá operando em modo experimental há 12 meses e, a partir do lançamento oficial, projeta-se que 3 mil fazendeiros e 20 mil hectares de terra sejam incorporados ao programa até fins de 2024 e, até 2050, o objetivo  é capturar 10 gigatoneladas de carbono equivalentes às emissões de 2 milhões de carros ao longo de um ano.

A parceria com BovControl e Belterra, estimulará reflorestamento e agroflorestas na compra de créditos de carbono e, com plataforma Sabiá, a Amazon se prepara para ser "market maker" no mercado de carbono com estimativas de 3 mil fazendeiros e 20 mil hectares cadastrados até fins de 2024 e após se tornar um dos principais nomes do e-commerce e serviços de computação em nuvem, a Amazon imprimirá marca na sustentabilidade, com iniciativa que implementa no Brasil e deve transformá-la em market maker do mercado voluntário de carbono. Fundada por Jeff Bezos e avaliada em US$ 1,9 trilhão, lançou oficialmente em 19 de setembro de 2024, a plataforma Sabiá que prevê utilizar créditos de carbono para estimular reflorestamento e adoção do sistema de agroflorestas, cujas árvores nativas são plantadas ou manejadas em associação com culturas agrícolas, sendo que a iniciativa foi informada pelo NeoFeed em janeiro de 2022 e começa ser implantada no Pará, no entanto, a ideia é estender ao restante do País e posteriormente ao mundo com participantes inscritos auxiliados pela Belterra, responsável por fornecer treinamento, assistência técnica e acesso a insumos, enquanto a BovControl,  cuida do desenvolvimento e gestão da Sabiá, que monitorará progresso dos agricultores na restauração de terras. Além de fornecer investimento ao programa de aceleração de agroflorestas e restauração, a Amazon responderá  pela compra dos créditos de carbono das atividades do programa, iniciativa, que deve movimentar entre US$ 5 e US$ 30 por tonelada, considerando valores praticados no mercado, com previsão de registrar receitas de US$ 120 bilhões até 2030, sendo que a NeoFeed avisou que a plataforma já vinha trabalhando com centenas de fazendas nos últimos 12 meses.  Trata-se da primeira iniciativa em que a Amazon se envolve diretamente com temas ambientais, em 2020, a companhia anunciou a criação do The Climate Pledge Fund, fundo de corporate venture capital de US$ 2 bilhões para investir em iniciativas voltadas à descarbonização, tendo investido na Rivian, de carros elétricos, e na Beta Technologies, de carros voadores, valendo dizer que o tema de crédito de carbono ganha tração no Brasil e no mundo, conforme estudo da Câmara de Comércio Internacional e consultoria de sustentabilidade WayCarbon. Por fim, a startupCarrot.eco, anuncia tokens de crédito de carbono com ganhos de até 20% sobre resíduos de compostagem desenvolvendo em plataforma blockchain à rastrear resíduos orgânicos usados em compostagem buscando tokenizar a cadeia de resíduos orgânicos em processo de compostagem, com a Carrot.eco, segundo o Valor, em fase de negociações com big techs norte americanas interessadas no sistema devendo lançar NFTs, tokens não fungíveis de créditos de carbono, com pagamento de até 20% do valor adquirido, vinculados a cadeia de resíduos, na ideia de disponibilizar tokens no mercado secundário através de marketplaces de NFTs, nesse caso, o valor dos criptoativos será calculado pela divisão entre detentores dos créditos de carbono resultantes do metano e gás carbônico que deixam de ser depositados em aterros ou lançados na atmosfera, devendo focar operações nos grandes geradores de resíduos orgânicos como indústrias alimentícias, restaurantes e supermercados, além de empresas que atuam na poda de árvores.

Moral da Nota: o Ministério Público Federal, MPF, 'manda' parar todos os tokens RWA de crédito de carbono, assim como todos projetos do tipo em documento recomendando que a comercialização de créditos carbono, no Brasil ou exterior, seja na forma de tokens ou não, seja suspensa imediatamente, além de contratos e tratativas em andamento no tema crédito de carbono e modelo de Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal, REDD+, que incidem nos territórios indígenas e tradicionais, com ou sem regularização fundiária definitiva, no estado do Amazonas. A iniciativa atinge projetos de Tokens RWA no Brasil vinculados a projetos no estado do Amazonas, sendo que a recomendação foi enviada ao governador do estado, ao secretário de estado de Meio Ambiente do Amazonas e secretarias estaduais, a prefeitos e secretários municipais, aos representantes das empresas, das instituições, das organizações não-governamentais, das certificadoras e atores públicos ou privados que atuam no mercado de crédito de carbono/REDD+. A recomendação solicita que seja dada publicidade ao documento nas mídias sociais, páginas da internet e grupos de aplicativos pertencentes aos referidos órgãos e empresas ou nos quais participam, considerando tratativas, contratos e comercialização devendo ser suspensos enquanto os requisitos definidos na recomendação não forem cumpridos, como comprovação de eficácia concreta da redução dos impactos climáticos via compensação de créditos carbono/REDD+, por meio de estudos científicos idôneos e internacionalmente reconhecidos, demonstração de não violação de direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais no estado do Amazonas, bem como territórios tradicionais decorrentes tratativas e aplicação de tais projetos, realização de consulta prévia, livre, informada e de boa-fé com povos indígenas e comunidades tradicionais potencialmente afetados pelos projetos, nos termos da Convenção 169 da OIT, regulamentação do tema, com respeito aos 3 itens acima, de modo gerar segurança jurídica aos povos e garantir aplicação adequada dos princípios da prevenção e precaução, conclui informando que, "o não atendimento das providências resultará em responsabilização dos destinatários e dirigentes recomendados, por sua conduta comissiva ou omissiva, sujeitando-os às consequentes medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis', segundo o MPF. Resumindo, no Amazonas, o MPF possui inquéritos civis em andamento que apuram temas de crédito carbono sobre territórios indígenas/tradicionais em contato com lideranças tradicionais das unidades de conservação estaduais, que são territórios tradicionais destes povos, tendo sido informado ao MPF que não houve consulta ou contato, que não conhecem a proposta e nem mesmo o modelo de funcionamento de contratos de crédito carbono ou REDD+ trazidos pela Secretaria de Meio Ambiente do Amazonas, Sema.