quinta-feira, 16 de maio de 2024

Oportunidade perdida

Para comemorar o Dia da Terra, o Arquivo de Segurança Nacional dos EUA publicou coleção de registros da Biblioteca Presidencial de Nixon e outras fontes, lançando luz sobre debates internos que conselheiros do presidente tiveram sobre mudanças climáticas e outras questões ambientais em meio à ascensão da política ambiental americana, sendo que registros publicados entre o assessor de Nixon, Daniel Patrick Moynihan, o conselheiro de assuntos internos, John Ehrlichman, e o vice-diretor do Escritório de Ciência e Tecnologia da Casa Branca, Hubert Heffner, entre outros, fornecem detalhes sobre avaliação climática  em 1971. Documentos da era Nixon publicados mostram que o presidente era reformista ambiental improvável, desdenhava o ativismo ambiental enquanto Democratas e Republicanos encontraram pontos em comum em questões ambientais e, os principais responsáveis ​​da Casa Branca de Nixon, tiveram liberdade para discutir e debater origens e impactos das alterações climáticas e implicações à política governamental sem o nível de polarização visto hoje e como resultado, Nixon deixou legado ambiental significativo promovendo aprovação de legislação importante e estabelecimento de agências-chave como a EPA e CEQ. Na melhor das hipóteses Nixon era ambivalente, muitas vezes irônico nas opiniões sobre ambientalismo e, em reunião privada com Henry Ford II, disse que previsões ambientais eram “muito exageradas” e criticou ambientalistas por quererem que os humanos “voltassem viver como bando de animais malditos” mas suas fulminações privadas sobre ambientalistas não o fizeram transitar à formulação de políticas, confiando nos conselheiros para gerir a política ambiental. A historiadora Joan Hoff esclarece que Nixon “entregou as políticas ambientais a Ehrlichman”, dizendo-lhes para “mantê-lo longe de problemas em questões ambientais”, enquanto, em privado, chamava o movimento ambientalista de “merda para palhaços”, no entanto, trouxe “ambientalistas enérgicos” como William Ruckelshaus e Russell Train para dirigir a EPA e o CEQ. Senadores democratas, incluindo Edmund Muskie e Henry “Scoop” Jackson, pressionaram Nixon para reforçar  regulamentações ambientais, “criaram problemas ao presidente”, com Jackson pretendendo coordenar a política ambiental do governo através do CEQ proposto pelo Congresso e Muskie propondo que empresas petrolíferas fossem responsabilizadas pelos derrames de óleo. Conselheiros de Nixon acreditavam que o aquecimento global, especificamente, era “assunto no qual a Administração deveria envolver-se” e 7 meses antes do 1º Dia da Terra, Moynihan escreveu a Ehrlichman alertando sobre perigos “do problema do CO2” incluindo temperaturas extremas e elevação do nível do mar, o que, segundo ele, significaria “Adeus, Nova Iorque. Um dos esforços ambientais internacionais mais notáveis, no entanto, foi o acordo ambiental EUA-URSS assinado por Nixon na Conferência de Moscou em Junho de 1972, abrangendo modelos de poluição atmosférica, pesticidas, conservação, preservação e previsões de terramotos com “até 700 cientistas e outros profissionais ambientais participando anualmente do programa de intercâmbio”, tornando-o um dos “mais abrangentes, bilaterais e ambientais”.

Um plano de 1971 buscando desenvolvimento de rede global de monitorização do CO2 nunca se concretizou, cuja proposta está detalhada em documento do Arquivo de Segurança Nacional dos EUA em que consultores científicos de Nixon iniciaram análise dos riscos potenciais das alterações climáticas propondo projeto de investigação sobre clima com benefícios que consideraram “imensos” à serem quantificados, envolvendo “garantir a sobrevivência do homem”, conforme documento da Casa Branca. Estabelecia 6 estações de monitorização global e 10 regionais em locais remotos para recolher dados sobre CO2, radiação solar, aerossóis e demais fatores que exercem influência na atmosfera, envolvia 5 agências governamentais em iniciativa de 6 anos e com gastos de US$ 23 milhões com ano de pico do projeto, 1974, equivalente a US$ 172 milhões em dólares atuais, utilizando tecnologia de ponta, algumas das quais só agora implementadas na monitorização do carbono, 50 anos depois, no entanto, investigadores do Arquivo de Segurança Nacional sediados na Universidade George Washington não encontraram documentação sobre o que aconteceu à proposta, já que esta nunca foi implementada. A monitorização foi autorizada pelo chefe do Gabinete de Ciência e Tecnologia da Casa Branca de Nixon, Edward E. David Jr. que ingressou na Exxon e, como presidente da Exxon Research and Engineering Company, de 1977 a 1986, assinou projeto  que usou um dos petroleiros para coletar CO2 atmosférico e oceânico, começando em 1979, relatada pela primeira vez em 2015 confirmando o papel dos combustíveis fósseis no aquecimento global e mostrando que a indústria petrolífera conhecia danos dos produtos,  agora peça-chave de prova em ações judiciais movidas por estados e cidades do país que procuram compensação da indústria petrolífera por danos climáticos. O Arquivo de Segurança Nacional em 2023 lançou projeto para compilar registro histórico do cálculo do governo dos EUA às alterações climáticas e, para marcar a Semana da Terra 2024, lançou livro informativo detalhando discussões sobre clima na Casa Branca de Nixon, incluindo o novo documento, considerando que conselheiros de Nixon o alertaram sobre riscos do aquecimento global com Daniel Patrick Moynihan instando o governo se envolver na questão já em 1969, mais tarde como senador por Nova York, observou que o aumento do nível do mar de 10 pés foi possível com um aumento de 3,9 ºC  ao escrever “Adeus, Nova York”,  “Adeus, Washington, por falar nisso.” Nixon, de fato, deixou para trás registro mais progressista em matéria de ambiente que seus sucessores republicanos, propôs e estabeleceu a Agência de Proteção Ambiental e mais tarde abraçou um Dia da Terra nacional, expandindo o conceito antes lançado pelo senador Gaylord Nelson, democrata de Wisconsin, e embora o governo nunca tenha embarcado em plano de monitorização do CO2 tão ambicioso como o proposto por conselheiros científicos, expandiria estações de investigação, como aconselharam, para além do único local em Mauna Loa, Havai, em funcionamento desde 1958 sendo que a NOAA, Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, abriu estações adicionais de medição de CO2 em Barrow, Alasca, Samoa Americana e Pólo Sul, em 1973.

Moral da Nota: nesta altura emergiu o escândalo Watergate e, Nixon, que tinha criticado ambientalistas por quererem que os humanos “voltassem viver como bando de animais malditos”, conforme recorda Santarsiero no livro informativo, aboliu o  gabinete de ciência e tecnologia e, seu líder, desistiu frustrado no início de 1973, conforme obituário no New York Times em 2017, na Exxon, pressionou por mais ciência relacionada ao aquecimento global e, além da pesquisa de amostragem, supervisionou transição à mais trabalhos de modelagem climática como na projeção do aumento da temperatura relacionado a concentrações de CO2, mas, no final da carreira, assinou artigo de opinião no Wall Street Journal de 2012, no qual os céticos da ciência climática argumentavam que não havia nenhuma razão convincente para descarbonizar a economia mundial. Em última análise, investigadores do governo dos EUA na NASA, NOAA e outras agências liderariam grande parte da ciência que levou a consenso sobre o aquecimento global, mas a política governamental ficou aquém das advertências dos cientistas, como sublinha o último documento dos arquivos de Nixon.


quarta-feira, 15 de maio de 2024

Revolução fotovoltaica

Emerge como líder na adoção de energias renováveis ​​na América Latina, o Chile, em particular, na produção de energia solar, cujos recursos naturais colocam o país em posição de transformar sua matriz energética, no entanto, o boom dos projetos solares avança mais rapidamente que a desativação das centrais a carvão, com o deserto do Atacama, no norte, mostrando níveis mais altos de radiação solar do mundo, por isso, a indústria de energia solar cresce exponencialmente porque “existem condições únicas para isso”, segundo a presidente do Acesol, conselho de administração da Associação Chilena de Energia Solar. Dados das Geradoras chilenas, associação de empresas de energia renovável, indicam que em 2023 a geração renovável atingiu recorde de 63,8%, maior valor desde que iniciaram os registros, com a geração solar representando 20% decorrente entrada em operação de mais de 1,1 gigawatt, GW, de projetos solares, em particular, energias eólica e solar com entrada massiva no sistema elétrico chileno desde 2013 “transformando a matriz energética do país”, segundo o gerente geral de Geradoras de Chile, acrescentando que em 10 anos a capacidade de energia solar aumentou de 8 megawatts, MW, à mais de 9 mil.Prevê-se que até 2024 a capacidade renovável instalada ultrapasse 29 mil MW, com investimento de US$ 30 bilhões na última década e, segundo especialista em energias renováveis, “as políticas atuais como a Rota Energética e Agenda Energética estão em consonância com a promoção da transição à fontes renováveis, assegurando que “não foi proposta eliminação total de fontes de energia baseadas em combustíveis fósseis. Segundo o Relatório do Chile Sustentable, das 28 usinas a carvão que operavam em 2019 quando começou o cronograma de descarbonização, 8 termelétricas estão fechadas, 12 comprometidas com fechamento até 2025 e 8 usinas a carvão não têm compromisso de fechar e poderiam operar até o ano de 2040, neste contexto, o Ministério da Energia lançou agenda inicial à um 2º período da transição energética que considera a implantação das primeiras 10 medidas em 4 áreas de atuação, ou, promoção do armazenamento, mitigação de riscos aos fornecedores, flexibilidade operacional de ações políticas regulatórias e obras urgentes.

Desafios enfrentados pelos projetos de geração no Chile, inclusive solares, “são elacionados às condições facilitadoras que permitem avançar na transformação do sistema elétrico e reduzir emissões de gases efeito estufa do setor” e, antes de tudo, há “necessidade de melhor aproveitamento das redes existentes e execução adequada do planejamento do sistema de transmissão”. Geradoras de Chile e Transmisoras desenvolveram estudo em 2022-2023 que identifica ações de curto, médio e longo prazo permitindo cumprir este objetivo, determinando que a maioria das medidas propostas não requerem alterações legais e permitirão gestão mais eficaz das redes de transmissão, maximizando utilização dos recursos e promovendo  infra-estruturas de modo rentável sem necessidade de folgas. Dados fornecidos pelas Geradoras do Chile mostram que, em mais de 80% dos dias de 2023, a geração renovável superou a geração térmica, além disso, houve momentos, como ao meio-dia do dia 30 de outubro em que a geração renovável instantânea atingiu 94,6% da energia elétrica total do sistema, neste contexto, tecnologias como sistemas de armazenamento, tornam-se cada vez mais importantes por fornecerem atributos de segurança, energia e flexibilidade, por exemplo, podem adaptar-se a mudanças imprevistas nas previsões de produção eólica e compensar diferenças de produção ao meio-dia e anoitecer quando a energia solar diminui. Outro desafio é resolver o  ciclo de  vida das tecnologias solares, ou seja, saber o que será feito com o  volume de materiais instalados no Deserto do Atacama e outras áreas do país, com o diretor do Centro de Energético de Antofagasta, CDEA, dizendo que a situação é “avaliada” porque a cada dia surge a questão de saber qual o destino final das instalações quando terminar sua vida útil destacando um grande desafio, ou, a regulamentação que o Chile possui no campo energético “são antigas e impossibilitam crescimento deste tipo de energia". No Chile existe compromisso com a descarbonização, metas de longo prazo que buscam cobrir até 60% da matriz energética com renováveis ​​até 2035 e até 70% até 2050, fundamentais à transição energética e apoiadas em iniciativas como Planejamento Energético de Longo Prazo, PELP, entre outras instâncias, já que o país tem elevado potencial de recursos solares no norte e recursos eólicos distribuídos por todo o território,  fato que promoveu a integração massiva de energias renováveis ​​solar e eólica. Conforme o relatório “Custos de geração de energia renovável em 2022” da Agência Internacional de Energia Renovável, IRENA, energia renovável implementada a nível mundial desde 2000 poupou US$ 521 bilhões em combustível no setor elétrico. Em suma, 2023, o carvão representou 17% da geração nacional de eletricidade, dados da Associação Chilena de Energia Renovável e Armazenamento, Acera, e, diante esse cenário, o Coordenador Elétrico Nacional anunciou saída de 20 termelétricas até 2025 que resultaria na capacidade de carvão instalado cair 69%, “marco relevante” no compromisso  com a descarbonização.

Moral da Nota: estudo que rastreia custos passados de eventos climáticos e os projeta ao futuro, indica que danos climáticos até 2050 serão 6 vezes o custo de limitar o aquecimento a 2ºC, subsistindo incógnitas sobre custos e benefícios que dependem em parte de incertezas remanescentes na ciência climática e pressupostos incorporados nos modelos econômicos. A revista Nature mostra que investigadores analisaram a forma como economias locais responderam aos últimos 40 anos de aquecimento e projetou esses efeitos à 2050, descobrindo que estamos empenhados em aquecimento que verá crescimento da economia global prejudicada em 20 % e coloca o custo de período limitado de alterações climáticas em 6 vezes o preço estimado de colocar o mundo no caminho de limitar aquecimento a 2°C. Estudos econômicos sobre alterações climáticas envolvem pressupostos sobre valor dos gastos atuais para evitar custos de um clima mais quente no futuro, bem como detalhes desses custos, ao passo que, pessoas por trás do trabalho, decidiram adotar abordagem empírica e obtiveram dados sobre o desempenho econômico de mais de 1.600 regiões individuais no  mundo, remontando a 40 anos procurando conexões entre esse desempenho e eventos climáticos. Estudos anteriores identificaram medidas climáticas, temperaturas médias, variabilidade diária da temperatura, precipitação total anual, número anual de dias úmidos e precipitação diária extrema, associadas a impactos econômicos e, alguns destes efeitos, como chuvas extremas, provavelmente terão efeitos imediatos enquanto outros como variabilidade da temperatura, provavelmente terão impacto gradual que será sentido ao longo do tempo. Testaram cada fator relativo a efeitos retardados significando impacto econômico algum tempo pós seu início sugerindo que fatores de temperatura poderiam ter impacto retardado de até 8 anos após terem mudado, enquanto mudanças na precipitação eram normalmente sentidas 4 anos após mudanças causadas pelo clima, embora esta relação possa estar errada relativamente a algumas mudanças econômicas em algumas regiões, sendo que a inclusão de regiões e de longo período de tempo limita o impacto dessas correlações. Realizaram amostragem aleatória para determinar incerteza no sistema que desenvolveram e procuraram ponto onde as incertezas de 2 cenários de emissões mais extremos se sobrepõem, o que ocorreu em 2049 e, depois disso, não podemos esperar que os impactos econômicos passados do clima se apliquem sugerindo que é indicação do aquecimento com o qual já estamos comprometidos, em parte, porque o efeito das emissões passadas não foi sentido na totalidade e em parte porque a economia global é barco que gira lentamente, portanto, leva tempo implementar mudanças significativas nas emissões, sendo que "tal enfoque no curto prazo limita incertezas sobre trajetórias de emissões futuras divergentes, enquanto a resposta climática a longo prazo resultante e validade da aplicação de relações clima-econômicas, historicamente observadas em longos períodos de tempo nos quais as condições sociotécnicas podem mudar."  As incertezas dos modelos climáticos aumentam com o tempo e a economia futura começa a parecer-se menos com a presente e coisas como temperaturas extremas começam atingir níveis onde o comportamento econômico passado já não se aplica.