Charles Snow, físico nuclear e romancista inglês, em Cambridge postulou o conceito de “duas culturas” em “abismo de incompreensão”, separando o mundo da ciência e intelectuais de humanidades, publicado em livro em 1959 e revisado em 1963. O Reino Unido, segundo Snow, estava preso ao antagonismo entre ciências e humanidades, com supervalorização da última em detrimento a formação básica científica, daí, a educação generalista em humanidades exuberava prestígio entre as classes altas em Oxford e Cambridge enquanto as classes médias e trabalhadoras buscavam formação especializada nas “novas” universidades. O autor contrasta a formação multidisciplinar da Alemanha e EUA alertando que os britânicos estariam em desvantagem política e econômica caso continuassem nessa divisão, isto, em contexto de 1959. Tal conceito desenvolve ideias, experiências e habilidades, permitindo combinações novas levando a percepções de outra forma inacessíveis, sendo que as descobertas da humanidade se inserem em pessoas que se engajaram em interesses variados e os integraram em redes empreendedoras.
Tal divisão, segundo o autor, coloca em risco a capacidade de indagar, prejudicando a resolução de problemas complexos, confinando investigação a conjunto de fatos e métodos enquanto exige compreensão multidisciplinar. Se inserem aí desafios de saúde, crises ambientais, econômicas ou sociais cujo alcance vai além de qualquer disciplina isolada. Surge daí o conceito de polimatia cuja abordagem se dá através de conhecimentos diversificados, colocando o conceito de duas culturas à margem do centro. Investigadores interdisciplinares adotam pensamento amplo, profundo e integrador, crucial na modernidade, ou, pensamento polimático no cerne da inovação e da crítica envolvendo exame amplo e rico do conhecimento além fronteiras e limitações presentes. A amplitude do conceito polimático fornece recursos ao pensamento crítico lançando luz sobre lacunas da investigação invisíveis a compreensão, auxiliando identificar fundamentos interdisciplinares em bases sólidas à pesquisas futuras. O florescimento do pensamento polimático exige da sociedade posicionamento adequado para alcançar inovação e enfrentar desafios urgentes.
Moral da Nota: C.P. Snow se associou ao crítico Frank Leavis debatendo o assunto. Para Leavis, Snow dava primazia ao uso econômico das ciências e tecnologias em prejuízo a valores das humanidades, centrais à civilização ocidental. Nos trinta anos do pós-guerra, o Ocidente viveu a revolução do jato, do plástico, a corrida aeroespacial, telecomunicações e o salto nas inovações informáticas. Pelo desenvolvimento rápido a população absorveu inovações em políticas e no Estado de Bem-Estar Social, com a Guerra Fria tentando convencer sobre benesses sociais, econômicas e tecnológicas dos respectivos lados. O resultado desigual afetou o Sul com a América Latina, África e Ásia inserindo instituições de ensino e pesquisa, muitas com apoio financeiro e intelectual dos desenvolvidos, focando na especialização. Emerge daí elite tecnocrata com insensibilidade humanística, exceção dos técnicos jurídicos e econômicos, “esquematizados ou matematizados,” desprovidos de humanidades com menor importância na escala social. Entre nós e nações do Sul vive-se o abismo entre humanidades e ciência, com inversão de poderes, uma elite sem formação humana sobrepondo-se a massa de intelectuais populares sem compreensão das ciências naturais e exatas. Uma educação interdisciplinar nas artes liberais, prepararia para avaliar um mundo de modo crítico, ético e sensível, sem desconsiderar recursos de comunicação efetiva, capacidade analítica lógico-quantitativa e visão compreensiva de fenômenos físicos e biológicos.