sábado, 21 de março de 2020

Lições de uma Pandemia

O ano era 1918 com a primeira guerra em seus estertores finais e mais de 70 milhões de mobilizados, neste ambiente, a 'gripe espanhola' que eclodiu no sul da Europa no verão de 1917 teve pico em outubro de 1918 na Europa Ocidental e América e últimas vítimas em abril de 1919. Em seu trajeto infectaria 5% da população mundial ou 500 milhões de pessoas, com a morte de 25 a 100 milhões à taxa de mortalidade de 4% embora outros avaliem 10%. O número de afetados se insere em dificuldades de países como Alemanha, Áustria, França, Reino Unido e EUA não relatarem números de contágio e morte, por receio de exploração pelo inimigo. No entanto, a Espanha neutra na guerra, contribuiu para sua identificação como ponto de origem.
Royal S. Copeland, médico formado em Michigan, com experiência na 'gripe russa' com letalidade de mais de 1 milhão de pessoas, reconhecido pela luta em organizar o combate à doença como presidente do Conselho de Saúde da Cidade de Nova York, considerou "a pior experiência do gênero". Em 17 de novembro de 1918 publicou no 'New York Times' artigo intitulado "Lições de uma pandemia: próxima vez". Buscando deixar lições a posteridade, oferece pista de como Nova York administrou os negócios com eficácia iniciando o artigo com um questionamento de "como a cidade conseguiu sobreviver?" Segundo Copeland, a primeira morte por pneumonia na cidade foi em 23 de setembro de 1918 seguindo um aumento constante até 23 de outubro, pico da epidemia com 5.390 casos de morte, a seguir declina até 10 de novembro. No final do ano, a companhia de seguros Metropolitan Life publicou relatório anunciando a morte de 75 mil clientes da empresa. Explicou que o modelo de Nova York alcançou 50 mortes/mil habitantes, ao contrário de Boston 101 mortes/mil, Washington 109/mil, Baltimore 149/mil e Filadélfia 158/mil. Copeland relata que foram tomadas medidas incluindo colocar na entrada da cidade em quarentena doentes que chegaram em barcos da Europa, além de registrar todos os relatórios da doença e sua penumonia irmã, com abertura de 150 centros de serviço em diferentes áreas da cidade. Os centros operavam em igrejas, escolas, casas particulares e cada um tinha contato telefônico, grupo de enfermeiras, auxiliares, voluntários, ambulâncias, transporte para entrega em domicílio de medicamentos, suprimentos e assistência médica. Foram coordenados com o Conselho Municipal de Saúde e compartilharam registro de leitos vagos nos hospitais para agilizar internação dos necessitados. 
Moral da Nota: a gripe espanhola tinha um problema inicial se era o mesmo agente da pandemia de 1898 ou se era outro. As epidemias em Boston, Nova Orleans ou Kansas não se conhecia se era o mesmo agente, vacinas nem pensar. Copeland descreve a doença como "o vírus que paralisa as pessoas no meio da rua, em fábricas e escritórios. Primeiro um calafrio, depois febre, dores de cabeça, dor nas costas e resto do corpo, olhos vermelhos, tontura, fraqueza, náusea e depressão". As terapias usadas eram descanso e isolamento, talvez quinino, aspirina, sendo que comerciantes promoviam Vick Vaporub, pó de lisol, purgativos e até Run Bacardi sendo que as autoridades aconselhavam evitar multidões e não usar metrô.