sábado, 14 de agosto de 2021

Iatrogenia e ambiente

Segundo o Fórum Econômico Mundial 269 milhões de pessoas no mundo são usuárias de drogas anualmente, inundando esgotos com componentes químicos degrados com efeitos semelhantes ao das próprias drogas. Estudo publicado no “Journal of Experimental Biology” na República Tcheca indica que poluição por medicamentos pode alterar até sexo dos peixes expostos à metanfetamina, que acabam preferindo água contendo a droga, manifestando modificações comportamentais e na saúde cerebral. Estações de tratamento de esgoto não filtram substâncias químicas, além do esgoto in natura que chega aos rios, permitiu estudo sobre metanfetamina afetando a truta marrom selvagem. Concentrações de metanfetamina e um de seus subprodutos, a anfetamina, a partir de medições das concentrações de drogas ilícitas nos cursos de água e detectadas no cérebro da truta marrom, suficientes para causar dependência nos animais. As trutas expostas à droga em tanques por oito semanas passaram por “período de abstinência” de dez dias sem drogas, tempo que os pesquisadores testaram a preferência dos peixes por água doce ou água com metanfetamina, comparando com respostas de peixes que nunca haviam sido expostos à droga. As descobertas indicam que peixes expostos à metanfetamina preferiram a água contendo a droga, preferência não demonstrada em peixes não tratados e, no período de abstinência as trutas expostas à metanfetamina se moviam menos, interpretado como sinal de ansiedade ou estresse típico de abstinência à drogas em seres humanos.

A química do cérebro divergia entre peixes expostos e não expostos, mudanças que correspondem ao que é visto na dependência humana, com efeitos comportamentais diminuindo pós dez dias de abstinência, sugerindo que exposição à metanfetamina pode ter efeitos de longa duração semelhantes aos observados em humanos. O estudo indica que as trutas estão “gostando” das drogas e se tornando viciadas, ficando inclinadas a pendurar em canos onde resíduos são descarregados. Os peixes podem se comportar de modo semelhante aos humanos dependentes, visto em estudos de diferentes espécies, com uma das marcas do vício a perda de interesse por outras atividades, mesmo as altamente motivadas, como comer ou reproduzir, coisa vista nos animais em seu comportamento natural causando problemas com alimentação, reprodução e, em última instância, sobrevivência, com menor propensão a escapar de predadores. Importante notar que a exposição às drogas não afeta apenas os peixes, mas seus descendentes sendo que o vício pode ser herdado ao longo das gerações com implicações nos ecossistemas. Em 2019, cientistas do Reino Unido relataram cocaína em camarões de água doce em todos os 15 rios amostrados, detectando drogas ilícitas com mais frequência do que produtos farmacêuticos comuns, sendo que os efeitos mais amplos dessas drogas permanecem desconhecidos.

Moral da Nota: medicamentos não se decompõem totalmente em nossos corpos chegando às estações de tratamento de águas residuais nas fezes e urina, com a maioria descarregada com efluentes de águas residuais entrando nos rios ou vazando de aterros, ou, campos agrícolas onde esgoto humano é usado como fertilizante. Animais selvagens de rios e águas costeiras onde o rejeito é despejado são expostos a coquetéis de medicamentos, de analgésicos a antidepressivos, inclusive com peixes de estações de tratamento mudando de sexo em semanas, decorrente exposição a produtos químicos que desregulam hormônios encontrados em pílulas anticoncepcionais. Antidepressivos causam mudanças comportamentais em organismos aquáticos como agressividade, atração pela luz e coragem crescente, além do vício em drogas ser problema de saúde global pode devastar comunidades e lidar com as consequências ambientais é caro. stimarivas indicam que seriam gastos US$ 50 bilhões para atualizar estações de tratamento de águas residuais na Inglaterra e País de Gales para remover produtos químicos, parecendo óbvio que drogas prescritas e ilegais mudam o comportamento dos humanos e da vida selvagem. No entanto, não há certeza que produtos sintéticos em produtos domésticos como cosméticos, roupas e produtos de limpeza, afetam comportamento das pessoas e de outras espécies.