quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Descentralização cambial

O NUG, governo paralelo de Unidade Nacional de Mianmar, liderado por apoiadores da líder presa Aung San Suu Kyi, declarou a Stablecoin Tether, USDT, baseada em dólares, como moeda oficial para uso local e, seu ministro das finanças explicando que a utilização do Tether melhoraria a velocidade do comércio e a eficiência dos pagamentos. Relatório da Bloomberg, informa que o NUG aceitará o Tether em sua campanha de arrecadação de fundos na luta contra o atual regime em Mianmar minando a proibição imposta pelo Banco Central de Mianmar em maio de 2020, sendo que a incorporação como moeda oficial de uso local é motivada por preocupações com privacidade e apreensão de fundos pelo atual regime. O ministro das Finanças do NUG referiu que o motivo central da incorporação do Tether é "o uso nacional para facilitar e agilizar atuais sistemas de comércio, serviços e pagamentos", considerando que o NUG foi reconhecido pelo Senado francês e Parlamento Europeu em outubro de 2021 como governo oficial de Mianmar, no entanto, os EUA não fizeram qualquer movimento a respeito. 

Mianmar, país em guerra no sudeste da Ásia, tem história política tumultuada com a criptomoeda desempenhando papel na definição do futuro político nacional, antes conhecido como Birmânia, esteve sob regime militar de 1962 a 2011 e, com a dissolução da junta militar em 2011 estabelecwu parlamento civil para o período de transição. Em 2015, emergiu a primeira eleição multipartidária em que Suu Kyi, filha do herói da independência, general Aung San, como líder apesar da produção de poder militar em esferas diversificadas. Em 2020, Mianmar teve sua segunda eleição, com o partido Liga Nacional à Democracia de Suu Kyi obtendo vitória e, sob alegação de fraude rejeitada pela comissão eleitoral do país, originou o golpe militar provocando forte reação. O Tether é moeda estável cujo valor está atrelado ao dólar, significando que seu o preço não flutua tal qual  criptomoedas voláteis como Bitcoin ou Ethereum e, cada Tether pode ser trocado por um dólar, tornando-o mais adequado à pagamentos apesar da controvérsia se pode ser respaldado por reservas. A Tether afirmou que as moedas são garantidas por dinheiro e seu equivalente, sendo que a empresa fez acordo no início de 2021 de US$ 18,5 milhões com o Procurador-Geral do Estado de Nova York, sem admitir irregularidades e, como parte do acerto foi impedida de fazer negócios no estado. Em outubro de 2021, investigação da Bloomberg revelou que a Tether, cujas reservas incluem papel comercial, empresta à grandes empresas chinesas e outros negócios de criptografia, arriscando corrida a bancos se os investimentos derem errado e, nesse mesmo mês, a Comissão dos EUA de Negociação de Futuros de Commodities multou a Tether em US$ 41 milhões por publicar declarações enganosas sobre suas reservas.

Moral da Nota: o NUG é governo paralelo que não controla nenhum território nem detém qualquer posição de poder em Mianmar, portanto, a aceitação do Tether pelo NUG não é o mesmo que aceitação do Tether por Mianmar como moeda legal. Levanta fundos pela venda de “Spring Revolution Special Treasury Bonds”, concebidos como instrumento de empréstimo direto, arrecadando US$ 9,5 milhões nas primeiras 24 horas de venda, sendo que, aceitar o Tether é desafio ao regime militar que proibiu criptomoedas. O Tether, maior stablecoin do mundo em capitalização de mercado, tornou-se ferramenta ao governo paralelo de Mianmar se levantar contra o regime militar e, como toda criptomoeda, não pode ser bloqueado por governos cujo sistema de transferência ponto a ponto oferece mais privacidade comparado a moeda fiduciária, daí, rastrear transferências de Tether ao NUG e evitá-las seria difícil à junta, permitindo que a revolução prosperasse. A decisão do NUG de aceitar e usar a stablecoin Tether pode tornar-se ponto de discórdia entre as nações, especialmente em momento que o governo americano tenta impor políticas restritivas à emissão de stablecoins.